Qual é mesmo a proposta da candidata Marina?

Passados os primeiros dias da entronização de Marina no PSB e de seu vice, Beto Albuquerque, é possível tecer algumas considerações sobre os movimentos da candidata e de seu partido de chocadeira, não por escolha, mas por contingência. Uma fotografia de algumas intenções da campanha é oportuna e esclarecedora.

Sua visão e proposta ambiental, que a levou a ser conhecida no País e mundo afora, veio até o grande público pelo trabalho pioneiro de Chico Mendes na floresta amazônica. Do Acre chegaram, até nós, as notícias do guerreiro amazônico que lutava a favor do meio ambiente diante das investidas de pecuaristas e madeireiras. Responsáveis pela devastação da floresta.

Marina deu os primeiros passos no entendimento do meio ambiente e suas relações com os povos da floresta e os fazendeiros pelas mãos de Chico Mendes. Pelo menos de berço a candidata teve formação de primeira qualidade.

Aprendeu ele, e a ela transmitiu, que o meio ambiente começa na gente, como seres vivos circundados pelos demais seres vivos do mundo vegetal, mineral e animal.

Até mesmo do mundo espiritual se as noções de sobrevivência, harmonia e solidariedade são incorporadas. Assim como for também incorporado o espírito majestoso da floresta amazônica, tão bem cantado e decantado pelo poeta Thiago de Mello.

Ou a lição ela desaprendeu ao longo dos anos vivendo nas grandes cidades, ou rendeu-se ela à noção urbana e acadêmica do meio ambiente, longe daquela gestada pela convivência com a floresta.

Em nota do atual presidente José Alves, em 27 de agosto, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri (Acre), fundado por Chico Mendes, discorda da candidata em pelo menos dois pontos.

Retira a inclusão, feita por ela, de Chico Mendes, como representante da elite nacional. Ao contrário da candidata, ela sim hoje parte dos entronizados, o presidente do sindicato de Xapuri trata Chico Mendes, morto por fazendeiros em 1988, como sindicalista, não como ambientalista.

Chico Mendes, como sindicalista, lutou pela união dos povos tradicionais (extrativistas, indígenas e ribeirinhos) contra a expansão das madeireiras e dos criadores de gado. A transformação dele em ambientalista, para o presidente do sindicato, foi levada ao País e ao exterior como forma de desqualificar e descaracterizar a classe trabalhadora do campo e fortalecer a noção capitalista ambiental.

Condena ainda a postura da ambientalista que se uniu ao capital, e a política ambiental por ela idealizada, quando ministra do Meio Ambiente. Considera a candidata dupla refém do modelo ambiental, que vê o meio ambiente como santuário, e das organizações não governamentais (ONGs) internacionais.

Aproveita a nota e estende a crítica, por fim, aos candidatos à Presidência por estarem pouco preocupados com a reforma agrária e os conflitos fundiários.

Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, 23 lideranças camponesas foram assassinadas somente no ano de 2014. Para ele, os candidatos não deram também a devida importância ao genocídio dos povos indígenas, muitos deles vivendo em situação alarmante.

É lamentável, sim, que os candidatos até agora não tenham se manifestado clara e abertamente sobre a reforma agrária, os conflitos fundiários e a questão indígena. Mas, a situação da candidata ambientalista é pior por ter vindo ela exatamente da região e do meio, onde essas questões e os conflitos são mais gritantes.

A grande questão é: sindicalista passa pela luta de classes com o capital, já ambientalista não necessariamente. O presidente do sindicato de Xapuri quis marcar bem a delimitação de uma categoria da outra. Os trabalhadores da região, por ele representados, não apoiam a visão e a postura ambientalista da candidata.

Então, se Marina não mais expressa as ideias e ideais genuínos de Chico Mendes, conforme nota do presidente do sindicato de Xapuri, ela não só reformulou seu ideário ambiental, mas também se afastou das raízes sindicalistas originais. Onde está ela então?

Sua aproximação conhecida com ONGs internacionais, organizações econômicas privadas fortes, como o banco Itaú e Natura, grupos evangélicos, alguns deles financeiramente sólidos, e de representantes de partidos políticos do bloco de oposição, PSDB e PPS, em suma, com organizações e grupos do poder dominante, demonstra que a candidata está mais perto de representações da elite econômica, financeira, religiosa e política do que de sindicalistas, trabalhadores e indígenas.

A elite se vê e se põe como poder estruturado e mandante. Não sem o apoio do capital. Ao contrário, se valem dele. Os que estão de fora, trabalhadores, se veem como povo e, como não há outro jeito no sistema vigente, são forçados a se porem como integrantes da máquina administrativa e produtiva.

E qual a linha mestra da aproximação da candidata com a elite do poder? Não é muito clara e objetiva, embora tenha sido por ela revelado que ela crê num chamamento, numa proposta de conciliação. Uma espécie de ecumenismo programático pelo ar.

Sua ideia, por exemplo, de se valer de figuras do PSDB para tratar da situação econômica e financeira e de figuras do PT para tratar da situação social mostra que ela, se eleita, pretende atuar como uma pastora dos rebanhos de posições políticas radicalmente opostas. Ela está acima de qualquer pecado mundano.

A mescla de visão urbana e religiosa das questões e problemas da floresta, de aproximação com a elite do poder econômico e financeiro, de ecumenismo pastoral na administração da agenda administrativa e política, com uma postura pessoal de idealismo e autoritarismo, fazem da candidata uma incógnita ou uma gelatina.

Incógnita porque a combinação de várias pontas não garante um nó seguro. Ainda mais se as pontas são de consistências e diâmetros bem diversos. E mesmo que o nó seja garantido, como será a postura pastoral? Será que a candidata consegue resolver os conflitos todos, tudo, ao mesmo tempo, assim de repente, a cada momento em que for exigida sua decisão?

Gelatina porque o intricado de acordos e interesses pode ser tão complexo e conflitante, que ao menor sinal de vacilo, acaba desandando. Vira água e água escorre pelo ralo, assim como o monumental castelo de cartas imaginado e erigido pela idealista. Nada contra idealismo desde que com começo, meio e fim, não por ecumenismo nunca dantes navegado.

Outros exemplos sem sucesso passaram pela história política brasileira, de infeliz memória. Jânio Quadros com sua vassoura foi um deles e mais tarde Fernando Collor com sua bandeira de luta contra os marajás. Temos agora um messianismo ingênuo ou eleitoral.

Qual é mesmo a proposta da candidata? Salvo melhor juízo, uma rede furada sem peixes. Muitas contradições soltas pelo mar. Ainda mais porque o ecumenismo da candidata ainda não foi combinado com os grupos políticos oponentes. Até Garrincha dizia isto ao técnico Feola antes dos jogos: a estratégia da seleção brasileira já foi acertada com os adversários para dar certo? Muitas tempestades, águas turvas e remoinhos pela frente. Até tsunamis.

 

Comentários

3 respostas para “Qual é mesmo a proposta da candidata Marina?”

  1. Avatar de Vanessa Cabral
    Vanessa Cabral

    Olá, amigos!

    Dando continuidade (por minha conta) às palavras de nossa querida Maria Luisa Luisa Medeiros (amiga em comum com muitos aqui) no intuito de somar esforços, também informando aos eleitores indecisos e, ainda, alertando àqueles da “Turma do Brax” que nos manteremos firmes, aí vai:

    Ainda que sendo um Governo de centro-esquerda (acredito que mais de centro do que de esquerda) como o é o PT, ainda que não representando diversas das forças e movimentos sindicais e, ainda que mantendo alianças um tanto duvidosas, as gestões do Ex-Presidente Lula e da Presidente Dilma insuflaram e deram poder à classe trabalhadora como não se via desde a década de 60 (estes tempos não vivi, obviamente, mas os livros e os estudos humanísticos tem aí o seu valor), abriram as portas para uma gente que não existia, que era invisível perante os olhos da sociedade, e para muitos outros, mesmo com toda a força oposicionista impondo obstáculos em cima de obstáculos para que as mudanças efetivas ocorressem. Existe muito a se fazer? Existe muito o que melhorar? Sem sombra de dúvidas! E aqui, cabe dizer: não esperem que 12 anos de um governo progressista, consertem mais de 500 anos de exploração e de erros não só desastrosos, mas catastróficos dos setores conservadores com o nosso Brasil. Precisamos de mais tempo, e de mais tempo neste caminho que tem seguramente dado bons frutos, apesar do que maldiz a mídia nacional, sabidamente inescrupulosa.

    A entrega da Petrobrás e dos nossos patrimônios e de tudo o que isso representa, a diminuição das articulações com o MERCOSUL, a estagnação do salário mínimo e das leis trabalhistas, a diminuição da geração de empregos, a redução do papel dos bancos públicos em prol de maior participação dos privados, uma política de juros altos, uma reafirmação do Estado Mínimo, o contínuo negligenciamento em torno das reformas intrínsecas a uma sociedade democrática (reforma política, tributária, agrária…), rejeição da participação ativa da sociedade civil na política, total desinteresse pela democratização e regulação econômica da mídia, a não revisão da Lei de Anistia e a não responsabilização dos militares torturadores da ditadura, o retrocesso nas conquistas dos diretos humanos (homossexualismo, divórcio, aborto…) e evidentemente um Estado falsamente laico como teríamos com a derrota do populismo?? NÃO!!!

    Um Governo contra o povo, contra o desenvolvimento e contra o progresso NÃO ME REPRESENTA MESMO (para usar um bordão de que todos gostam)!!!

    Nenhum de vocês nunca se perguntou o porquê de os conservadores neoliberais terem tanto horror e se esmerarem tanto em derrotar o PT? O próprio José Agripino, velho conhecido nosso do coronelismo potiguar e coordenador da campanha de Aécio Neves, declarou abertamente nestes dias que vale tudo (se referia à um possível apoio à Marina no segundo turno) contra um mal maior, que seria o PT. Por que estas pessoas com tanto dinheiro (nosso dinheiro), que nem de longe defendem os nossos interesses, têm tanto medo do PT?
    Ou o porquê de os candidatos da direita não entrarem em detalhes de seus programas de governo durante os debates eleitorais e seguirem se equilibrando em um discurso demagógico? Se estes assumissem publicamente que suas gestões resultariam em desemprego e dependência, não teriam 0,1% das intenções de voto.

    É por tudo isto e mais um monte que tenho votado e mantenho o meu voto no Partido dos Trabalhadores, e que publico e reproduzo textos, matérias e charges a favor do Governo e contra os setores reacionários. As minhas ações e intenções, com isto, não são a de meramente uma militância cega e descomprometida, são atos que acredito serem responsáveis por causar algum impacto (por menor que seja) no meu círculo de amigos e que também acredito poderem fazer estes mesmos amigos refletirem e tomarem a decisão que confiarem ser a mais acertada para toda a nação.

    Fica a opção de refletir ou não aos que lerem…

    13jos à todos também rsss

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