Dois caminhos, duas histórias!

Há uma década, seria difícil pensar que desemprego massivo, precarização do trabalho, pobreza ou exclusão social seriam expressões que poderiam descrever muitos países da União Europeia.

É assim que o economista Jorge Aragón, diretor da Gazeta Sindical, e o secretário de Organização e Comunicação da Confederación Sindical de Comisiones Obreras (CCOO) abrem a edição(1) de número 22 da publicação.

O presidente da Confederação Europeia de Sindicatos, Ignacio F. Toxo, avança, afirmando que, com a crise internacional e a forma de enfrentamento, a distribuição de riqueza perde equidade, ampliam-se as distâncias entre países e a desigualdade entre as pessoas.

O caminho para a saída da crise nos países centrais tem sido o de ajuste fiscal, redução dos gastos e do investimento público, alta dos impostos, queda da atividade econômica, aumento do desemprego, arrocho salarial, destruição de direitos trabalhistas, tudo para que o orçamento público salve o sistema financeiro, preserve o estoque de riqueza e a renda de poucos. Bem, esse é o caminho neoliberal.

Recentemente, o FMI voltou a cortar as projeções de crescimento para a economia mundial, alegando que o desempenho tem sido decepcionante, com performances desiguais entre países e regiões.

A Europa patina na recessão, o Japão permanece parado, os Estados Unidos, depois de um primeiro semestre ruim, apresenta sinais de melhora. As taxas de crescimento dos países em desenvolvimento também foram reduzidas pelo impacto que o travamento das economias desenvolvidas acarretou.

No Brasil, foi construído outro caminho. Em outubro de 2008, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou para uma conversa os membros do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).

Na oportunidade, os conselheiros apresentaram a ele a intepretação que tinham sobre a gravidade da crise e a importância de o Brasil preservar a qualidade e a liquidez do sistema financeiro, garantir crédito etc. Foi destacado que seria fundamental sustentar o mercado interno de consumo, preservar empregos e salários.

“Como poderíamos sinalizar que vamos gerar mais empregos?”, perguntou Lula. E a resposta foi: um grande investimento em habitação geraria emprego rapidamente, reduziria desigualdades e melhoraria a qualidade de vida das pessoas.

O presidente colocou o pé no acelerador e, no começo de 2009, lançou o Programa Minha Casa, Minha Vida, com o anúncio da construção de 1 milhão de moradias.

Desde o início, o caminho escolhido foi o de enfrentar a crise com medidas de caráter e qualidade distintos daqueles que fazem parte do receituário neoliberal.

O caminho que o Brasil trilhou é também difícil de ser percorrido. Exige muito de todos, em especial do Estado e do governo, que enfrentam inclusive a ideologia neoliberal que desqualifica esse caminho.

Trata-se de mobilizar todos os recursos econômicos, fiscais e políticos para preservar o emprego, os salários, a dinâmica interna de consumo e produção, adequar-se à perversa competitividade internacional de excesso de capacidade produtiva.

Um caminho de crescimento mais lento, porque mobiliza todos para o enfrentamento; porque não joga para toda a sociedade o custo do enfrentamento; porque é capaz de preservar os direitos, o emprego, os salários, sustentar a demanda interna, a atividade empresarial e construir uma saída afirmativa.

É esse caminho que deve ser seguido, ampliado e aprofundado. Os ajustes futuros devem visar a melhorar a performance dessa política.

Nesse caminho, deve-se ousar articular, de forma mais aprofundada, o emprego e o salário, com dinamização industrial integrada aos setores agropecuário e de serviços, com base na sustentabilidade ambiental dos processos produtivos, da qualidade dos produtos e da forma de uso; ampliar o investimento em infraestrutura econômica e social, no desenvolvimento dos serviços e equipamentos urbanos, entre outros desafios estratégicos.

Esse é o caminho para avançar nas atuais bases para o desenvolvimento econômico e social. É a rota que tem sido trilhada!

Hoje, com orgulho, podemos dizer para os companheiros sindicalistas europeus: o Brasil fez diferente e precisa continuar fazendo. Almejamos, e queremos cooperar na luta política, para que o caminho que estamos trilhando seja em breve novamente a escolha dos governos europeus.

Aqui temos feito nossa parte!

Notas

(1) GACETA SINDICAL: Reflexion y Debate. Por un nuevo contrato social. Madrid: CCOO, nueva etapa, n. 22, jun. 2014. Disponível em: <http://www.ccoo.es/comunes/recursos/1/pub126084_N_22._Por_un_nuevo_contrato_social.pdf>.

Comentários

6 respostas para “Dois caminhos, duas histórias!”

  1. Avatar de Assis Ribeiro
    Assis Ribeiro

    Sem mais e sem menos. Desindustrialização e especulação

    O imediatismo, o medo, a vulnerabilidade, e a aparência da sociedade líquida de Zygmunt Bauman.

    Nos debates sobre qual o modelo econômico que o próximo governo de Dilma irá abraçar tornou-se uma unanimidade de que a desindustrialização terá que ser atacada para que o Brasil volte a crescer. As dúvidas pairam sobre se os instrumentos para tal vão advir do neoliberalismo ou do desenvolvimentismo.

    A tentativa de alguns de apresentarem como novo a possibilidade de harmonizarem os princípios neoliberais e os desenvolvimentistas não se sustenta frente à história com os exemplos do malfadado governo de Tony Blair e a sua “terceira via” e as necessidades de reformulação dos princípios defendidos pelo programa de Marina Silva a todo o momento em que ela ou seus assessores de economia abriam a boca na apresentação de cada um dos pontos do seu projeto para a economia.

    O imediatismo, o medo, a vulnerabilidade, e a aparência da sociedade líquida abordada por Zygmunt Bauman não permitem que se faça um estudo honesto dos motivos da crise no Brasil e pelo mundo.

    Não se pode analisar com seriedade a desindustrialização de forma desconectada do modelo atual de financeirização da economia. A visão de economistas do mainstream promovidos a gurus pela mídia é a de substituir a visão a longo prazo, própria da indústria, pelo ganhar o máximo possível no mais curto espaço de tempo. Uma perfeita adaptação ao pensamento de Bauman em suas constatações sobre os dramas e incertezas da sociedade moderna.

    Nesse modelo atual os lucros buscados pelo capital entraram no circuito da especulação financeira, paradoxalmente seguro e altamente lucrativo. Os exemplos são onde na Europa e nos EUA com juros beirando ao negativo, ou mesmo negativo, o capital não migrou para a produção. Em países com o Brasil de juros altíssimos, mais certo ainda que o capital não irá para a produção.

    No Brasil a situação é ainda mais cruel pelas propagandas da mídia e de seus gurus econômicos que massificam a ideia de tirar os instrumentos de gestão do Estado para equilibrar as finanças públicas na tentativa de impor critérios que conduzem à recessão ou estagnação econômica, nas pressões sobre o aumento dos juros que leva à necessidade crescente de mais percentagem do PIB para pagar a dívida pública.

    A finanismo bloqueia o desenvolvimento, toma o lugar do investimento produtivo, os capitais refugiam-se na especulação ou em paraísos fiscais. No período de FHC esse rentismo aniquilou a procura agregada, esmagou as micro, pequenas e médias empresas. No seu governo ficou demonstrado que quanto mais medidas de incentivos à “iniciativa privada” e privatizações houve, mais o investimento se reduziu e o endividamento cresceu.

  2. […] estratégia que gerou empregos e aumentou o consumo interno. Os dois caminhos são analisados em um artigo publicado no Brasil Debate por Clemente Ganz Lúcio, sociólogo, diretor técnico do DIEESE e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e […]

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  4. […] daqueles que fazem parte do receituário neoliberal.”O artigo completo você lê aqui: http://brasildebate.com.br/dois-caminhos-duas-historias/#sthash.6lw4pT9Z.dpufAlisson Matos, editor do Conversa […]

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