Ditadura Constitucional, de Temer-Alckmin

Publicado no blog do Roberto Amaral em 5-9-2016

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Roberto Amaral. Foto: Roosewelt Pinheiro/ABr

A concentração na Avenida Paulista, domingo último (4), reuniu algumas dezenas de milhares de pessoas. Algo muito distinto dos 40 “gatos pingados” da aritmética frívola do presidente em doce vilegiatura. Tanta gente que nenhum veículo de imprensa ousou anunciar seu número. O Datafolha desta feita, precatado, não se interessou por apresentar estimativa. Da Paulista, essa multidão ordeira, composta majoritariamente de jovens (o que é novo e importante e significativo) caminhando de forma pacífica, cantando e exibindo cartazes, entoando palavras de ordem como o atualíssimo “Fora Temer”, seguiu, sem incidentes, até o Largo do Batata, distante uns oito quilômetros, onde a manifestação (cercada por um aparato bélico sem justificativa) se encerrou, após breve comício.

Ao final, começou a dispersar-se, pacificamente, repito, recebendo dos organizadores a recomendação de “evitar provocações”. De nada, porém, adiantou a precaução, porque o projeto temerário e irresponsável da PM era espancar, respondendo a provocações ou não. A velha e cediça e estéril forma de intimidação de que se valem os Estados policiais. Já distantes do centro da aglomeração, que, repito, se dispersava, ordeira e pacificamente, ao fim de uma marcha democrática, estávamos — além de mim, os médicos Aitan e Helenita Sipahi, septuagenários como eu —, o deputado Paulo Teixeira e o senador Lindbergh Farias, que dava uma entrevista. Foi quando nos vimos atingidos por uma onda de gás lacrimogênio e eu senti no braço esquerdo um forte impacto seguido de dor aguda.

Havia sido atingido por um projétil de borracha, ou fragmento de uma bomba, de uma das muitas centenas de bombas lançadas e explodidas contra a massa indefesa, assustada e tomada por justo pânico. Já era muito difícil respirar, a garganta ardia, nossas vozes sumiam, os olhos lacrimejavam, a visão se tornara turva e, sem alternativas, corremos, corremos todos nas mais variadas direções, em busca de saída que era simplesmente abandonar o teatro das ações e procurar respirar. Alguns se refugiaram nos vários bares, onde, no entanto, foram atacados pelos soldados em fúria.

Seguimos, eu, Paulo Teixeira e Lindberg, amparados e guiados por jovens populares que nos levaram pelas estreitas ruas do bairro. Atrás de nós explodiam bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral e lá no fundo jatos d’água. O cenário me fez retornar aos anos de chumbo da ditadura militar.

Assim se inaugura a “ditadura constitucional” que é apenas dos produtos do golpe de Estado que depôs Dilma Rousseff. É apenas o começo. Dias piores virão, pois o Estado autoritário é a conditio sine qua non para a implantação do governo anti-popular. Meirelles-Serra sucedem Campos Bulhões e Temer (com o acento de sua mediocridade pessoal) será a releitura anacrônica de Castello, que era mais feio por dentro do que por fora.

Quem viver, verá.

Roberto Amaral é cientista político, ex-ministro da Ciência e Tecnologia e ex-presidente do PSB.

 

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