Desde que as denúncias sobre o aeroporto da cidade de Cláudio apareceram, o candidato a presidente Aécio Neves, por diversas vezes, se defendeu afirmando que a obra foi feita “não só dentro da legalidade, mas também com transparência e ética”.
No entanto, a análise dos estudos técnicos sobre o aeroporto demonstram que a obra foi realizada de maneira, no mínimo, antiética. Ademais, não obstante o assunto moral, a declaração também chama bastante atenção por falar em “transparência”.
Transparência passa a ideia de exatidão e, principalmente, de acesso fácil aos documentos que podem explicar a obra (i.e. custos, metas, justificativas). Isso traz certa motivação para tentar destrinchar todo o planejamento sobre o aeroporto, que foi feito na tutela do Programa Aeroportuário de Minas Gerais (PROAERO).
Não é fácil achar tais documentos na Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas de Minas (SETOP-MG). Nem mesmo o PSDB os disponibilizou, o que causa certa desconfiança, já que essa “transparência” ajudaria a explicar o que está obscuro até hoje.
Todavia, graças à internet, é possível analisar três estudos sobre o PROAERO apresentados em eventos aparentemente acadêmicos. São eles: “Programa Aeroportuário de Minas Gerais”, no VII SITRAER – 2008 [1]; “Readequação da Malha Aeroviária”; “1ª Seminário Nacional de Logística e 10º Seminário de Transporte” – 2010 [2] e“Perspectivas para a política aeroportuária no Estado de Minas Gerais: inovação e redesenho das ações frente ao novo cenário de descentralização, delegação e concessão de aeródromos públicos da união“, no V CONSAD – 2012 [3].
A leitura dos três textos (encoraja-se, aqui, os leitores a fazerem o mesmo) leva às seguintes conclusões principais:
O aeroporto foi considerado irrelevante inclusive no PROAERO: Nos textos [1] e [2] constata-se que a obra de Cláudio não é considerada relevante para a região. Exemplo disso são as figuras A e B que mostram o antes e o “depois” da malha aeroviária mineira. A dúvida aqui é: por que Cláudio, um pólo de metalurgia da América Latina, ficou de fora dos desenhos da malha aeroviária futura? Aliás, nota-se que o aeroporto da região de Lagoa da Prata – que foi descartado pela SETOP em 2012– estava nos planos anteriores do PROAERO. Como explicar abrir mão de um pelo outro?
O valor foi mal calculado: Observa-se, ainda, que os preços envolvidos no planejamento parecem não coincidir com o desembolsado pelo Estado de Minas. Pela tabela 7 de [1] – figura C – nota-se que o valor estimado para obras em aeroportos seria de, aproximadamente, R$ 64.000.000,00. Um cálculo rápido demonstra que Cláudio levou, só com obras (R$ 14.000.000,00 – sem contar a desapropriação), cerca de 22% desse valor. Ressalta-se, também, que cidades mais importantes como Itabira e Ouro Preto ficaram de fora e não possuem aeroportos até hoje.
O planejamento foi atropelado em prol da construção do aeroporto: Verifica-se em [1] que os aeroportos de Sete Lagoas e Chapada Gaúcha deveriam ficar prontos em 2009 e isso não ocorreu (até hoje). O aeroporto de Cláudio, entretanto, era previsto para 2010 e foi feito no prazo! Detalhe para a importância industrial e regional das cidades deixadas de lado: Sete Lagoas tem o PIB 15vezes maior que o de Cláudio enquanto Chapada Gaúcha fica numa região com fraquíssima malha aeroviária. A estratégia óbvia seria concluir primeiro os de 2009 para depois seguir para os de 2010;
Se não tivesse sido feito como prioridade, Cláudio não sairia do papel: Pela reformulação do PROAERO em 2010, visto em [2] e [3], a cidade de Cláudio estaria dentro do raio de Divinópolis (100km) e, portanto, não teria necessidade da realização do aeroporto.
Argumento comparativo: Será mesmo que Cláudio merece um aeroporto e Itabira não?
Itabira, como se vê em [1], poderia ter sido uma cidade igualmente contemplada pelo PROAERO em 2010. Por ser uma a cidade que abriga a Vale, é muito (mas muito mesmo) difícil que Cláudio tenha qualquer importância geopolítica maior que ela! Fica então a pergunta: por que então foi escolhida em detrimento da terra de Drummond?
1. Seria o PIB? Itabira tem o PIB aproximadamente 14 vezes maior que o de Cláudio. São quase 4,8 bilhões de reais contra 340 mil.
2. Seria o aeroporto local? Na região de Itabira não existe aeroporto com a proximidade estabelecida pelo PROAERO, uma vez que Ipatinga fica a 111 km da cidade (o dobro da distância Divinópolis-Cláudio). Ademais, o leste mineiro carece de uma boa malha aeroviária. Um aeroporto em Itabira, segundo a própria SETOP, beneficiaria São Gonçalo do Rio Abaixo, que tem quase R$ 2,8 bilhões de PIB. Sem falar nas cidades de Barão de Cocais e João Molevade, todas relevantes para a indústria mineira.
3. Seria a população? Itabira tem a população estimada (para 2013 segundo o IBGE) quatro vezes maior que a de Cláudio. Sem falar no turismo itabirano que, certamente, é bem superior.
4. Seria o valor? Um Aeroporto no Ceará foi construído por R$ 19 milhões e tem uma boa infraestrutura. Será que com 14 milhões não daria para fazer um bom aeroporto? Se não, como foram calculados os valores pelo SETOP?
Depois de ler os estudos técnicos de planejamentos e algumas notícias, infere-se claramente que o aeroporto de Cláudio é hoje um benefício privado, construído com dinheiro público.
Observa-se que cidades muito mais tradicionais social e economicamente não tiveram o mesmo privilégio que da cidade que abriga o “Palácio de Versailles” do ex- governador mineiro. Aécio tem muito o que explicar, pois, considerando o que está disponível para análise, conclui-se que Cláudio está longe de merecer um aeroporto na velocidade e nos moldes do que foi feito.
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